Pai: Filha, você está assistindo um desses filmes de violência?
Filha: Não, pai. É a realidade...
Consta na Revista Newsweek desta semana a lista de sucessos e decepções do cinema em 2005. O filme Cruzada encontra-se na segunda lista, o que pessoalmente discordo por ser um filme épico, por ter o Orlando Bloom como protagonista e pelo detalhismo do diretor Ridley Scott. É bem verdade o final da produção não foi muito satisfatório, mas faz parte... Bem, talvez os elogios às Crônicas de Nárnia me consolem.
Voltemos ao Cruzada e ao nosso tema. Gosto muito de História, talvez por ter sido abençoada com ótimos professores, ou por tudo ser mesmo fascinante. Mas a verdade é que fatos históricos não se mudam, só se lamentam (ou celebram se for o caso). Seu estudo leva à reflexão e talvez à mudança, e isso é excelente. E esse filme me fez pensar.
A primeira cruzada foi convocada pelo papa Urbano II em 1095, levando centenas de pessoas a uma peregrinação em direção à Jerusalém para tirá-la do domínio turco otomano e instituir sobre ela um governo cristão, com a promessa de que assim se purificariam de seus pecados e alcançariam a salvação. O argumento de persuasão é que centenas de peregrinos cristãos eram brutalmente mortos ou escravizados no caminho para a Terra Santa. Em 1099 Jerusalém foi invadida, dez mil pessoas assassinadas (homens, mulheres e crianças) e em 1100 foi coroado um rei cristão. Mas o que poderia ser uma jornada religiosa rapidamente se transformou em um jogo de interesses por terras, títulos de nobreza, poder, dinheiro e muito sangue. E assim chegamos à época relatada no filme de Ridley Scott, com a sucessão do trono cristão do rei Baldwin IV em jogo e o rei Saladino na iminência de recuperar o domínio muçulmano em Jerusalém.
Não contarei o filme, mas uma das minhas reflexões sobre ele. Percebi o domínio ideológico imposto por uma Igreja já corrompida, onde a voz papal era incontestável por pura falta de conhecimento da literatura sagrada, onde se mostra um Cristo humilde, misericordioso e pacífico. Então porque as guerras em nome da fé? Jesus disse uma vez que se alguém nos bater em um lado da face, devemos deixar que nos batam do outro lado também. Disse e também deu o exemplo: foi preso, torturado e morto sem reclamar. Ele é o Filho de Deus e Rei por excelência, mas não se vendeu aos poderes terrenos. Ora, se Jerusalém estava sob um governo indesejado, que os cristãos os deixassem por lá, afinal, o próprio Cristo também disse que Seu reino não é deste mundo. Se a vontade de Deus fosse Jerusalém ser dada a um rei cristão, não precisaria ser necessariamente através de uma guerra. Então que fosse negociada a entrada dos peregrinos e que as políticas fossem deixadas de lado. Os papas e seus conselheiros não estavam lá de armas em punho, arriscando a vida para tomar a Cidade Santa, assim como os Srs. George W. Bush e Tony Blair também não estão no Iraque de uniformes camuflados e metralhadoras nas mãos para tentar impor ordem ao território. Engraçado como é fácil expor outros a riscos e assistir à sombra o mundo pegar fogo. São atitudes como estas que geram em dezenas de Balians de Ibelin o conflito existencial por partir em busca de algo que nem se sabe se realmente vão encontrar: a paz, a liberdade e a esperança de retornarem vivos para casa.
Oitocentos anos depois, a paz em Jerusalém continua incerta, e as vidas ceifadas nas guerras, perdidas para sempre. Cristo ainda reinará sobre Israel e a grande maioria dos conflitos do mundo é desnecessária, mas que difícil é para os humanos enxergarem isso! O dinheiro, o poder e a fama falam mais alto e pouco a pouco vemos a humanidade e o planeta sucumbir numa avalanche de descontrole e disputa de interesses. Mas deixem os poderosos cavalgarem em sua soberba. Parece que vejo se repetir a história contada por Jesus, onde um homem rico se gaba de suas conquistas e de repente ouve-se a voz de Deus dizendo: “Louco, hoje à noite pedirão a tua alma, e o que tens, para quem será?”. Que assim seja...